Parado ao sol, o escorpião olhava ao redor da montanha onde morava.
- Positivamente, tenho de me mudar daqui – pensou.
Esperou a madrugada chegar, lançou-se por caminhos empoeirados até atingir a floresta. Escalou rochedos, cruzou bosques e, finalmente, chegou às margens do rio largo e caudaloso.
- Que imensidão de águas! A outra margem parece tão convidativa… Se eu soubesse nadar…
Subiu longo trecho da margem, desceu novamente, olhou para trás. Aquele rio certamente não teria medo de escorpião. A travessia era impossível.
- Não vai dar. Tenho de reconsiderar minha decisão – lamentou.
Estava quase desistindo quando viu uma rã sobre a relva, bem próxima à corrente. Os olhos do escorpião brilharam:
- Ora, ora… Acho que encontrei a solução! – pensou rápido.
- Olá, rãzinha! Me diga uma coisa: você é capaz de atravessar o rio?
- Ih, já fiz essa travessia muitas vezes até a outra margem. Mas por que você pergunta? – disse a rã, desconfiada.
- Ah, deve ser tão agradável do outro lado – disse. Pena eu não saber nadar.
A rã já estava com os olhos arregalados.
- Será que ele vai me pedir…?
- Se eu pedisse um favor, você me faria? – disse o escorpião mansamente.
Que favor? Murmurou a rã.
- Bem – o tom da voz era mais brando ainda -, bem, você me carregaria nas costas até a outra margem?
A rã hesitou:
- Como é que eu vou ter certeza de que você não vai me matar?
- Ora, não tenha medo. Evidentemente, se eu matar você, também morrerei – argumentou o escorpião.
- Mas… e se quando estivermos saindo daqui você me matar e pular de volta para a margem?
Nesse caso eu não cruzaria o rio nem atingiria meu destino – replicou o escorpião.
- E como vou saber se você não vai me matar quando atingirmos a outra margem? – perguntou a rã.
- Ora, ora… quando chegarmos ao outro lado eu estarei tão agradecido pela sua ajuda que não vou pagar essa gentileza com a morte.
Os argumentos do escorpião eram muito lógicos. A rã ponderou, ponderou e, afinal, convenceu-se.
O escorpião acomodou-se nas costas macias da agora companheira de viagem e começaram a travessia. A rã nadava suavemente e o escorpião chegou quase a dormir. Perdeu-se em pensamentos e planos futuros, olhando a extensão enorme do rio. De repente se deu conta de que estava dependendo de alguém. De que ficaria devendo um favor para a rãzinha. Reagiu, ergueu o ferrão.
- Antes a morte que tal sorte – pensou.
A rã sentiu uma violenta dor nas costas e, com o rabo do olho, viu o escorpião recolher o ferrão.
Um torpor cada vez mais acentuado começava a invadir-lhe o corpo.
- Seu tolo! – gritou a rã.
- Agora nós dois vamos morrer! Por que fez isso?
O escorpião deu uma risadinha sarcástica e sacudiu o corpo.
- Desculpe, mas eu não pude evitar. Essa é a minha natureza.