Há uma maioria no Bloco de Esquerda ?
Há e não há … explico, há, desde a fundação do Bloco, uma coligação de três correntes, a UDP, o PSR e a Política XXI.
Mais outra explicação, não são “tendências organizadas”, tal como é definido pelos Estatutos bloquistas. São ex-partidos (a UDP e o PSR) que passaram a “Associações Políticas” e a “Centro de Estudos” (Política XXI/Fórum Manifesto).
Mas são correntes organizadas ou não são? Estão organizadas, têm vida própria (ex: fazem congressos, editam imprensa e até pertencem a Internacionais) mas não se assumem como “tendências” estatutariamente reconhecidas.
Ou seja, a maioria é, afinal, uma soma de várias minorias não assumidas … entre essas minorias parece haver um acordo (que só essas minorias conhecem…) para que o controlo do Bloco de Esquerda não caia nas mãos de outras minorias que se assumem estatutariamente como tendências. Esse acordo tem uma face que o garante, é Francisco Louçã, apresentado pela imprensa como o “Líder”, mas estatutariamente o coordenador da Comissão Política.
É claro que as minorias que fazem a maioria do Bloco, são mesmo diferentes entre si. Diferentes no percurso que já fizeram, diferentes no património politico e ideológico. O controlo da organização do Bloco tem sido mais importante que a assumpção dessas diferenças. Tirando alguns resultados autárquicos medíocres e as últimas presidenciais, reconhece-se que esta coligação de minorias tem tido saldo quantitativo e qualitativo muito positivo.
Estas minorias são, de facto, diferentes entre si. Ainda bem, já que a diferença é motivadora de debate. Ou seria, já que essa diferença não é assumida. Entre ex-maoistas/estalinistas com uma evolução interessante (a UDP), trotsquistas (o PSR) e um sector proveniente do PCP, em evolução para um posicionamento social-democratizante de esquerda, seria positivo que as diferenças propiciassem debate. Mas não … o controlo da organização parece ser um imperativo mais forte!
Não obstante os Estatutos – aprovados também pela coligação de minorias -, o certo é que as outras minorias que não pertencem à direcção política, são, cada vez mais, remetidas para uma espécie de gueto no Bloco de Esquerda. Servem para exibir o ramalhete da pluralidade, mas no seio da organização, são marginalizadas e enxovalhadas em público por membros da direcção política.
E o mais caricato, é que as únicas tendências que se organizaram às claras e de acordo com o definido estatutariamente, foram correntes que não pertencem à coligação de minorias, também conhecida por maioria. Não criaram nenhuma “Associação Política”, constituíram-se mesmo em tendências organizadas de acordo com os Estatutos. São a “Esquerda Nova” e a Ruptura/FER.
Sobre cada uma destas tendências minoritárias, os membros da direcção política, pertencentes às minorias coligadas na maioria, periodicamente saem a público, i.e. na imprensa que nem é do Bloco, com tomadas de posição, onde o “parece que é” é misturado com mentiras descaradas com pitadas de meias-verdades ... até parecendo que o objectivo é “limpar” a organização ao sabor purgativo de tristes exemplos que a História regista!
Felizmente o Bloco de Esquerda é um partido-movimento diverso e plural no seu seio. Até porque, para além das minorias referidas, existem também muitas e muitos aderentes que não são de minoria nenhuma. São só do Bloco e pensam pela sua cabeça!
Uma das forças identitárias do Bloco foi a sua capacidade para convergir no seu seio, inúmeras experiências políticas e ideológicas. Essa convergência tem sido também um motor para o seu crescimento social e eleitoral.
A convergência de correntes de esquerda no quadro de uma organização política é um facto de importância estratégica nos dias de hoje. Mas, só por si, essa convergência nada provocará se não conseguir desenvolver-se de forma dinâmica, i.e. com mantendo sempre entre todas as correntes níveis crescentes de democracia, de liberdade e de transparência. Infelizmente, a convergência fundacional do Bloco de Esquerda tem servido, nos últimos anos, para a afirmação de uma liderança centrada numa pessoa e numa maioria que se eterniza à custa da diminuição da democracia interna, da perseguição mediática às minorias (correntes ou aderentes considerados individualmente) e de um controlo quase totalitário de toda a organização.
A crescente falta de democracia interna, não obstante o formalismo dos Estatutos, revela também um problema de crescente ausência de perspectivas políticas. Todo o processo relativo à intervenção nas últimas presidenciais é disso revelador. O pacto existente entre as minorias que compõem a coligação maioritária da direcção política, para assegurarem o controlo administrativo de toda a organização, provoca uma crescente ausência de debate interno. Ausência de debate não só em toda a organização, mas também entre as minorias que compõem a actual maioria. Ou seja, a obsessão do controlo da organização sobrepõe-se ao livre debate político e ideológico!
O Bloco de Esquerda é o conjunto dos seus aderentes e a pluralidade de todas as suas correntes. Foi assim que nasceu, foi assim que se desenvolveu, é assim que deverá continuar! Mas para isso, é urgente uma nova direcção política que saiba interligar aprofundamento da democracia interna com um permanente e livre debate político e ideológico no plano interno.
Quantas minorias tem o Bloco de Esquerda? Muitas e quantas mais melhor … porque num quadro de plena democracia interna, isso não é um problema, é um motor para mais crescimento, mais intervenção com maior capacidade política e social. São também condições necessárias para a intervenção do Bloco na reorganização do espaço da esquerda socialista e anti-capitalista em Portugal!
NOTA FINAL: À esquerda a discussão não pode, não deve ficar confinada aos espartilhos partidários. A esquerda precisa de consensos transversais, precisa de convergências para que seja possível uma alternativa de esquerda e socialista de poder. Todas e todos os activistas de esquerda deveriam participar e aproveitar todos os espaços e foruns para discutirem com conclusões os desafios que se colocam ao socialismo nos tempos da globalização neo-liberal e capitalista. Disponibilidade para a discussão, não é perder tempo, é ganhar!
João Pedro Freire