Dinis Costa, presidente da Câmara Municipal de Vizela, recusa o discurso politicamente correcto. Foi presidente de Junta de Freguesia no tempo em que o concelho de Vizela ainda não tinha sido restaurado. Chegou à presidência do Município em 2009 e garante, em entrevista ao Correio do Minho/Rádio Antena Minho, que a separação de Guimarães valeu a pena.
P - Dezasseis anos após a restauração do concelho de Vizela, valeu a pena todo o processo que levou ao dia 19 de Março de 1998?
R - Fica-me mal dizer que o concelho de Vizela é um mundo de maravilhas. Eu fui secretário de uma Junta de Freguesia, presidente de Junta, adjunto de um presidente de Câmara, vereador, vice-presidente e presidente da Câmara Municipal de Vizela. Costumo dizer que ninguém me ensina nada em matéria autárquica. Para mim as pessoas estão em primeiro lugar e digo que estamos a fazer de Vizela uma marca. Costumava dizer que a maior freguesia do concelho de Guimarães era o Vitória de Guimarães. Estive na Assembleia Municipal de Guimarães a representar os presidentes de Junta na Assembleia Distrital de Braga, mas nunca pus em causa os meus princípios e convicções. Andei nas lutas pela restauração do concelho de Vizela. Vizela é um concelho lindo com 24 mil pessoas, mas há 16 anos estava muito atrasado em termos de infra-estruturas. Hoje temos cobertura de abastecimento de água a 93 por cento e saneamento básico a 90 por cento. Pedimos meças a qualquer concelho do país. Em termos de educação estamos na patamar da excelência com cobertura total de ensino pré-escolar e dois centros educativos. Pena foi que Vizela só fosse concelho em 1998. Se tivéssemos tido acesso aos fundos comunitários, também tínhamos construído piscinas e pavilhões que hoje davam prejuízo, mas tínhamos . Hoje, um autarca não é avaliado pelas obras megalómanas, mas por aquilo que faz em função dos outros.
P - Há um novo paradigma do autarca?
R - O nosso paradigma é estarmos atentos aos problemas sociais. Por isso a acção social é um pelouro meu na Câmara Municipal de Vizela, tal como o ambiente e o turismo.
P - As questões entre Vizela e Guimarães estão ultrapassadas?
R - Estão. As questões de carácter paroquial têm de acabar. Temos um relacionamento institucional com Guimarães óptimo. Temos de fazer uma política intermunicipal. Se calhar, o pavilhão multiusos de Guimarães servia também muito bem o concelho de Vizela. Temos de preparar o futuro para isso.
P - Portanto, justificou-se a criação do concelho de Vizela?
R - E de que maneira! Vizela tem hoje um mercado municipal, tem um parque multiusos, tem a zona ribeirinha requalificada, tem o projecto-âncora das termas com um hotel a funcionar. Temos a honestidade política e intelectual de dizer que valeu a pena.
P - Este Governo já lançou timidamente para cima da mesa a questão da junção de concelhos. Como vê essa possibilidade?
R - Nem sequer quero ouvir disso! Acha que vai haver alguém que concorde com isso? Não. Se vierem com uma proposta de régua e esquadro à Miguel Relvas como fizeram com as freguesias.,, Isso vai ser tudo rebolado.
P - Acredita que a reforma das freguesias é reversível?
R - Têm de se tomar medidas em relações às freguesias mais distantes dos centros urbanos.
P - Na sua tomada de posse apontou como prioridade o projecto de Estaleiro de Criação Artística.
R - É pela Educação e Cultura que Portugal tem de vender. Vizela tem de ter uma marca.
P - Tentou envolver a oposição na partilha de responsabilidades…
R - Apesar de ter maioria, convidei o vereador da coligação ‘Vizela para Todos’, Miguel Lopes, para assumir pelouros. Ele aceitou, mas depois retiraram-lhe a confiança política. Devia haver uma consensualização sobre as metas que temos de ter e sobre as nossas dificuldades financeiras. Propus um acordo à coligação de consensualização sobre as grandes questões.
P - A administração central foi madrasta para Vizela?
R - Foi e continua a ser madrasta. Defendi que Vizela, Trofa e Odivelas, os três últimos concelhos criados em Portugal, deviam ter um ‘polis’, um programa especial de apoio. Os investimentos que fizemos foram feitos com recurso a capitais próprios.
P -A Câmara Municipal de Vizela aderiu ao Programa de Apoio à Economia Local (PAEL). Já recebeu os oito milhões de euros?
R - Ainda não. O Governo aprovou um financiamento de cerca de oito milhões de euros, mas nós tínhamos pedido mais seis. Na altura, na banca, só conseguimos três milhões. Estávamos convencidos de que, ao reduzirmos três milhões de euros de pagamentos, isso seria argumento para não termos arranjado os outros três milhões. Estou à espera de resolver esta questão porque a dívida não acaba. O problema da Câmara Municipal de Vizela são os credores.
P - A actual situação financeira da Câmara Municipal de Vizela resulta também do facto de ter apanhado o comboio dos fundos comunitários já em andamento e não ter tido aí um grande fonte de financiamento?
R - De 1998 a 2005 não tivemos absolutamente nada. Daí que eu era defensor de um programa de apoio especial aos novos municípios. Já tinha passado a época em que entravam milhões por dia em Portugal.
P - Nessa altura Vizela tinha grandes carências?
R - Estávamos com 50 anos de atraso relativamente a qualquer concelho do país. Abastecimento de água e saneamento básico tínhamos numa freguesia e em metade de outra. Através da empresa ‘Vimágua’, fizemos um investimento de oito milhões de euros e hoje temos cobertura total. Na área ambiental passou-se o mesmo. O rio Vizela está praticamente despoluído também, e vamos ser sérios, pela falência de empresas a montante. O Sistema Integrado de Despoluição do Vale do Ave (SIDVA) foi um investimento político. Para despoluir um rio começa-se a montante e começou-se a jusante.
P - Que projectos tem o Município de Vizela para apresentar ao novo quadro comunitário de apoio?
R - Temos muitos projectos na área ambiental e da eficiência energética. Na área das acessibilidades, o Governo defende e bem o financiamento comunitário de troços de estradas até 10 quilómetros, mas não tem ainda o apoio da União Europeia. Isso resolvia-nos o problema dos acessos às auto-estradas A11 e A3-A7.
P - Vizela precisa de melhorar as acessibilidades?
R - Uma pecha do concelho é a falta de uma acessibilidade rápida às auto-estradas. Nas horas de ponta temos dificuldades na estrada nacional 106.
O novo quadro comunitário de apoio será mais virado para a formação e para o turismo. Sou vice-presidente da Comunidade Intermunicipal do Ave e estou muito atento. Tenho algum receio de ficar para trás. A grande área metropolitana de Lisboa é sempre favorecida e agora parece que vamos ter o Porto. A Associação de Municípios do Vale do Ave apareceu aqui há uns anos para retirar poder a Braga e ao Porto, para fazer o equilíbrio. Chegou a ter um peso político significativo e um peso nas candidaturas aos fundos comunitários que agora perdeu.
P - Porquê?
R - Porque apareceram as comunidades intermunicipais. A do Ave não tem o peso político que tinha a associação de municípios.
P - Isso tem a ver também com as características dos autarcas?
R - Se calhar tem.
P - Teme que, na distribuição dos próximos fundos comunitários, ao centralismo de Lisboa surja o centralismo do Porto?
R - O Porto queixa-se de Lisboa, mas nunca teve peso político. O palco do presidente da Câmara Municipal do Porto não é o mesmo que o meu. Não vale a pena fugir à realidade: as pessoas que têm palco têm de o usar.
P - Quando se discute o novo quadro comunitário de apoio, os autarcas dos distritos de Braga e Viana do Castelo parece que não se sentam à mesma mesa para projectos comuns,
R - Exactamente. Porquê o Quadrilátero Urbano? A mim não me diz nada. Para Braga, Barcelos, Famalicão e Guimarães talvez. Já disse ao presidente da Câmara Municipal de Fafe que temos de olhar para Mondim de Basto, Cabeceiras de Basto, Póvoa de Lanhoso e Vieira do Minho. O que é o Quadrilátero Urbano? O que é que representa? O que é que faz? Se for para fazer um filme, também arranjamos seis municípios e sabemos como é que se chama. Se for para fazer uns passeios e umas reuniões, também arranjamos. Se visse uma sintonia entre Braga, Guimarães, Famalicão e Barcelos, ganhávamos todos. O que é que o Quadrilátero Urbano vale? zero. Ainda há por aí uma Grande Área Metropolitana do Minho com dinheiro a prazo. Já disse para distribuírem o dinheiro pelos municípios que a mim faz-me muito jeito. Nós andamos por aqui a arranjar umas associações que se confundem com outras. Temos de ter uma visão do potencial enorme do distrito de Braga em termos de juventude, em termos industriais e em termos políticos. E exigir do Governo aquilo a que temos direito.
P - Isso não tem sido assumido?
R - Não. E não há um líder, não há uma voz. E não é fugir à minha responsabilidade, mas não é o presidente da Câmara Municipal de Vizela, tão pequenina, que o vai ser.
P - O turismo é um sector importante em Vizela. As Termas estiveram fechadas e foram reactivadas. É uma mais valia do concelho que começa a dar os seus frutos?
R - Exactamente. A requalificação da zona ribeirinha foi feita em função disso.
P - A reactivação das Termas foi um processo complicado.
R - Muito complicado. Venho de uma reunião com a administração do grupo Tesal. O que acontece é que Vizela tinha oito mil clientes termais e nós temos de reintroduzir o projecto ‘Vizela, Rainha das Termas’, mas não o podíamos fazer com as Termas a caírem de podre e fechadas. Tivemos de reorganizar um processo que teve fim à vista com o grupo Tesal. Depois de quatro anos fechadas, qualquer investidor tem de começar de menos zero. Aqueles oito mil clientes fidelizaram-se noutros locais. Hoje, temos o hotel a funcionar, temos obras nas Termas e, até ao fim do ano, teremos as Termas reformuladas. Teremos também de associar a marca Vizela ao bolinhol, à gastronomia, ao património romano. Temos um excelente roteiro turístico que temos que articular com Guimarães.
P - Guimarães é um pólo de atracção turística muito forte. Vizela quer aproveitar disso?
R - Eu disse que as questões paroquiais têm de acabar. Eu fiz uma proposta à Fundação Cidade de Guimarães que, infelizmente, não foi aceite. Os concelhos de Vizela, Fafe, Famalicão e Póvoa de La- nhoso podiam ter tirado partido da Capital Europeia da Cultura. Vizela é uma ‘cittaslow’, em rede com 150 cidades do mundo.
P - A capacidade hoteleira de Vizela é suficiente?
R - Não. A Câmara Municipal de Vizela tem um castelo que está a degradar-se. Vamos colocá-lo à venda com uma condição: que seja uma pousada de referência ou um hotel para se enquadrar na zona ribeirinha e no projecto âncora de requalificação das Termas de Vizela e da zona envolvente. Hoje, o que me dá maior alegria é passar pela zona ribeirinha e as pessoas dizerem: ‘Isto valeu a pena’. E sentir que fui eu e a minha equipa que tivemos essa visão.
P - Espera que as Termas de Vizela venham a atingir os oito mil clientes que teve no passado?
R - É muito difícil. O cliente nacional, que era grande potencial das Termas, é agora uma grande minoria. O que estamos a aproveitar em termos turísticos é a grande procura pela cidade de Guimarães.
P - A indústria têxtil teve um peso dominante em Vizela. Tem havido algum reinvestimento no sector?
R - Quem investiu e se modernizou continua. Vizela tem três ou quatro empresas de sucesso com exportações na ordem dos 40, 50 milhões de euros. As grandes empresas de referência que tínhamos acabaram com a abertura ao mundo asiático e à mão-de-obra barata. Em 2000, com a abertura ao mundo asiático, a indústria têxtil em Vizela praticamente acabou e o desemprego subiu de forma descomunal. Hoje estamos em primeiro lugar na descida do desemprego. Em 2013 nasceram 81 empresas em Vizela, 22 por cento das quais exportadoras. Criámos expectativas de investimento no concelho com os PIM (Projectos de Interesse Municipal) e taxas mais baixas. Temos um problema a nível distrital, e muito pouca gente pensa nele, que é o peso do grupo Inditex.
P - Recentemente, acompanhou um outro partido político nessa denúncia.
R - Falei nisso com o Bloco de Esquerda porque, de facto, o grupo Inditex tem na mão cerca de 40 mil pessoas no distrito de Braga. Se um dia o grupo mudar para outro país, o que vai acontecer?