Certo Verão quente, na capital, conhecemos David, de 14 anos, que se perde na montanha de sentimentos da adolescência, entre os amores, os amigos, a mãe ausente e o avô, no hospital, cuja hipótese de morte iminente David se recusa a colocar.
Um argumento simples, realista, onde as palavras não dizem tudo e são os olhares, os gestos e os momentos de introspecção que nos ajudam a saber o que vai dentro de cada personagem, conhecer os seus dilemas, a sua dor. Desde o David rebelde, sem futuro em vista, ao David protector da mãe, da irmã e do avô - que paira sempre como um espectro ausente mas muito presente e cuja importância na vida do protagonista parece ser crucial -, o David apaixonado, desiludido, desencantado, revoltado, perdido...
Os personagens encontram-se com a sua realidade com uma naturalidade invejável, especialmenteDavid Mourato, que encarna este protagonista desafiador, justo, triste, solitário. Entre os seus amigos, reencontramos Rafa, que conhecemos da curta-metragem homónima de Salaviza e que aqui nos faz uma visita, tornando-nos quase como parte de Montanha.
Mas mais que todo o lado humano da longa-metragem, o deslumbramento chega desde o primeiro plano, com uma fabulosa direcção de fotografia que faz da iluminação a verdadeira protagonista. Filmado em 35 mm, João Salaviza consegue fazer da imagem um elemento repleto de significação, com a luz e a escuridão a assumirem este papel principal. Somos inundados por perfis que surgem das sombras, vultos tímidos, que se mexem naqueles prédios de um bairro social de Lisboa... Sensações, sentimentos, melancolia, medo, a adolescência a jogar a sério com David, o adulto que surge aos poucos na criança que ainda é.