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Out 19

publicado por José Manuel Faria às 12:08

Esta semana uma aluna de doutoramento ligou-me. Queria falar comigo porque era do PAN, e queria saber se isso teria algum impacto na nossa relação académica. Agradeci-lhe o cuidado mas expliquei-lhe a minha estupefacção - não com ela, mas com os tempos que correm. Então eu iria mudar o meu comportamento com um aluno pelo partido em que ele está? Mas se ela tem essa dúvida, estes são tempos perigosos. São os tempos em que vi, com os meus olhos, colegas mulheres a sugerir que autores "machistas" não fossem citados como se se pudesse confundir a obra com o autor; são os tempos em que Woody Allen está no índex e o PM do Canadá pede desculpa por se ter vestido de Aladino negro num baile de Máscaras; são os tempos em que gente amiga dos animais ameaça seres humanos para proteger animais - são tudo formas claras de ameaça ao Estado de Direito democrático, de apelo à censura, onde obviamente em muitos casos a fronteira entre a legalidade democrática e a associação criminosa é ténue. Disse-lhe que nem ela vai deixar de ser do PAN nem eu vou deixar de escrever criticamente sobre o PAN, que eu como orientadora devo ser atenta, diligente, dar-lhe a melhor bibliografia, ler com cuidado o que escreveu, escutá-la, sugerir-lhe fontes, métodos, e contribuir para ela ter uma tese brilhante - sei que vai ter porque já conheço o seu trabalho sério. Fiquei aliás muito feliz quando me pediu para ser orientadora e já sabia que ela era do PAN quando aceitei o convite para orientar a sua tese.

Escrevi sobre o PAN 0,005% dos artigos da minha vida, os outros, 90% críticos, foram sobre os Governos PSD/CDS e PS, dediquei 6 ou 7 livros de história onde há uma crítica explícita ao Bloco Central que nos conduziu à decadência nacional histórica. É certo que nunca me ameaçaram por isso. Nem me insultaram. Fiz uma tese de doutoramento crítica sobre o PCP no 25 de Abril. Tenho um razoável número de artigos públicos a discordar muito das posições do BE. Tenho alunos de vários partidos, de partido nenhum, outros abstencionistas convictos e muitos não faço ideia do que são - respeito-os a todos. A fronteira da liberdade de pensamento é para mim fundamental - faz parte da minha Declaração dos Direitos Humanos.

Só há uma coisa que não tolero, o fascismo. O fascismo não é uma ideologia, não nos sentamos à mesa para um debate com o fascismo, o fascismo é o ataque ao adversário pela coação - psicológica ou física. Um fascista não procura ter um conjunto de ideias, ele visa, ameaça; o fascismo procura coagir, é usar da força para se impor aos outros, é lançar o ódio e a violência. Se é em nome de animais, contra ciganos, alentejanos, isso é irrelevante. É fascismo na mesma e cabe ao Estado, e aos partidos, perceberem quando os seus militantes atravessam do campo maravilhoso do debate de ideias, que pode ser duro e forte (e mais forte será quanto mais e melhores argumentos tiverem os adversários), para a linha da violência contra o adversário, da punição e da coação, directa ou indirecta - estilo visar aqui, tagar ali, bombardear acolá, usar a força, ou até, como vi agora face a lideranças negras, ameaçar explicitamente de morte. Aqui entramos no campo da necessidade da ilegalização porque a democracia é incompatível com a ameaça. Milícias - com impacto organizado nas redes sociais - não são gente a lutar por ideias, são milícias.

Não faz parte da minha profissão coagir ninguém para ser ou deixar de ser de um partido, nem da dela impedir-me de criticar seja quem for. Obviamente que ela é uma mulher excepcional, e reagiu como eu (é um pouco mais velha do que eu, de uma “velha guarda de democratas”), dizendo que esse era o seu modo de estar na vida, é também o meu, combinámos uma jantarada, de vegan e de carne, temos as duas cães, e gostamos as duas de animais. Temos grandes diferenças políticas, e não as vamos ocultar, e não teremos medo de conversar sobre elas. Vamos estar juntas, na vida académica, e, creio, brindar muitas vezes à democracia e à liberdade de pensamento - contra o mundo fanático que nasce a cada dia, urge um mundo da luta organizada de ideias por ideais.

publicado por José Manuel Faria às 11:38

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